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O que é uma moeda digital de banco central (CBDC)?

CBDCs prometem combinar transferências monetárias e eletrônicas de ponto a ponto com a influência econômica de moedas fiduciárias

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Foto: Shutterstock

Moedas digitais emitidas por bancos centrais (ou CBDCs, na sigla em inglês) são exatamente o que o nome sugere: são versões digitais da moeda fiduciária de um país.

Mas como se diferenciam do dinheiro que está em uma conta bancária digital, sendo usada para fazer transações digitais com cartões de débito?

Por que governos querem ter CBDCs? Quais países já lançaram seus projetos de CBDC?

O que é uma CBDC?

CBDCs são versões digitais da moeda corrente de uma nação.

São similares a stablecoins, que são criptomoedas lastreadas e de proporção 1:1 com uma moeda fiduciária específica.

Mas stablecoins, como Tether (USDT), são gerenciadas por entidades privadas que possuem dinheiro emitido por um banco central ou equivalentes monetários. Armazenam esses ativos para que suas stablecoins possam refletir o valor exato de moedas fiduciárias.

O Fundo Monetário Internacional (ou FMI) considera CBDCs como uma nova forma de dinheiro que tem forma digital, emitida pelo banco central de um país e deve atuar como uma moeda legal.

Bancos centrais literalmente imprimem dólares americanos ou libras, então as cédulas físicas em suas carteiras não atendem o critério de “forma digital”.

E o dinheiro que você movimenta digitalmente em seu banco é, na verdade, uma série de depósitos eletrônicos lastreados pelo ativo de bancos comerciais; 97% do dinheiro armazenado por empresas e cidadãos britânicos são depósitos bancários comerciais.

O bitcoin (BTC), a maior criptomoeda do mundo, se encaixa em dois dos critérios mencionados acima: é digital e é uma moeda corrente em El Salvador. Mas o bitcoin não tem nada a ver com o “CB” de “banco central” da sigla. Não é emitida pelo Banco Central de El Salvador.

Mesmo se o banco minerar bitcoin em massa, isso não conta como “emissão monetária”, conforme esclarecido por um ex-conselheiro da Receita Federal dos EUA (ou IRS) em entrevista ao Decrypt.

Como funciona uma CBDC?

Às vezes, os Estados que desenvolvem uma CBDC consideram o blockchain como a tecnologia de alicerce para suas moedas, mas o banco central mantém autoridade sobre os registros. Em contraste, criptomoedas são descentralizadas, sem autoridade central.

Existem muitas formas diferentes que CBDCs possam ser praticamente implementadas pelos países. Mas se esses projetos vierem à tona, CBDCs terão de funcionar em carteiras móveis parecidas com Apple Pay ou Google Wallet.

Nas Bahamas, que lançaram uma CBDC em outubro de 2020, o banco central emite “sand dollars” assim como o dólar bahamense. Também mantém um registro de todos os sand dollars em circulação.

Em parceria com fornecedores privados, um banco central mantém uma infraestrutura de “conheça seu cliente” (ou KYC) em que cidadãos precisam completar etapas para criar uma carteira móvel.

Sand dollars facilitam pagamentos eletrônicos de ponto a ponto sem um intermediário com uma conta bancária, que é a principal ideia por trás de projetos de CBDC: escaneie o código de barras em seu celular para realizar um pagamento em uma loja e enviar dinheiro para outra carteira móvel.

Por que governos querem uma CBDC?

O Banco de Compensações Internacionais (ou BIS) apontou três motivos para o crescimento das CBDCs em seu relatório anual: a atenção em torno do bitcoin e outras criptomoedas, o debate sobre stablecoins e a entrada das “Big Techs” nas finanças.

Preocupações sobre a intromissão das grandes empresas de tecnologia nas finanças, como a Diem, stablecoin já abandonada do Facebook, também surgiram no Banco Central Europeu (ou BCE).

Em um relatório publicado em junho de 2021, o BCE disse que governos evitem apresentar CBDCs ameaçam seus sistemas financeiras e autonomia monetária de “gigantes [empresas] estrangeiras de tecnologia de possivelmente oferecerem moedas artificiais no futuro”.

Mas existem muitos outros motivos.

CBDCs também podem acelerar o reembolso de dinheiro em épocas de crise, conforme relatado em uma pesquisa de maio de 2019 pelo Instituto e Faculdade de Atuários.

Em um relatório de julho de 2021, o FMI disse que CBDCs podem promover a inclusão financeira, pois cidadãos não precisariam de uma conta bancária para pagar com CBDCs.

É algo importante em países como a Indonésia, em que 1/3 da população não tem acesso às finanças tradicionais e que provavelmente não tem acesso à internet móvel.

Fan Yifei, vice-presidente do banco central chinês, afirmou, em abril de 2020, que uma CBDC irá reduzir usos ilícitos de dinheiro, já que o dinheiro físico é anônimo e também pode ser facilmente falsificado.

MasterCard, que processa pagamentos eletrônicos, estima que o custo da gestão do dinheiro físico seja de 1,5% do PIB de um país. Então países podem poupar muito mais (se não completamente) ao recorrerem ao digital.

Quais países estão trabalhando em uma CBDC?

Existem 108 países, incluindo autoridades monetárias como a União Europeia, que estão estudando CBDCs de uma forma ou de outra. Representam mais de 90% do PIB global.

Três deles lançaram CBDCs até hoje: Bahamas, Jamaica e Nigéria.

49 deles estão na fase de “piloto” e outros 56 estão ou em “desenvolvimento” ou “pesquisa”. Bancos centrais estão tentando entender qual é o atrativo dessas moedas e se realmente querem lançá-las.

No caso dos Estados Unidos, depois de muito tempo sem um posicionamento sobre o assunto, tem crescido a aversão às CBDCs. Está em tramitação no Congresso um projeto de lei que busca proibir a criação de uma criptomoeda oficial do governo dos EUA. A ideia é evitar que o país consiga controlar, rastrear ou interferir nas transações financeiras dos cidadãos.

Governos também não têm pressa para estudar as consequências de segurança das CBDCs.

Em abril de 2021, o Banco do Japão lançou a primeira fase de um estudo de viabilidade para seu iene digital, que entrou em fase piloto em 2023. Enquanto isso, a Coreia do Sul seguiu o mesmo caminho e também tem sua moeda digital em modelo piloto.

A CBDC da China, o yuan digital, é o piloto mais famoso no momento. Foi usado em mais de 1 bilhão de transações, totalizando mais de 7 trilhões de yuans (ou US$ 986 bilhões) até o fim de junho de 2024.

No início do projeto, em 2021, o país distribuiu gratuitamente milhões de yuans digitais a cidadãos como parte de sua iniciativa para testar a tecnologia (e criar uma agitação em torno dela).

E-krona, da Suécia, também está na fase de testes-piloto, mas existe bem menos burburinho em torno dela.

Outra CBDC em fase de pilotos é a e-hryvnia da Ucrânia, com testes de CBDCs no mundo real oficialmente começou em agosto de 2021, mas com dificuldades de avanço por conta da guerra.

Em janeiro de 2021, o banco central do país assinou um acordo com a Stellar Development Foundation (ou SDF), a organização por trás da criptomoeda Stellar (XLM), mas não disse se sua CBDC será emitida no blockchain Stellar.

Por falar nisso, a Rússia também está preparando sua CBDC, o rublo digital. Planejado para 1 de julho de 2025, ele foi adiado após a resistência de bancos e varejistas. Agora, o banco central russo aponta 1º de setembro de 2026 como nova data, embora o lançamento da moeda digital exija uma mudança na lei.

Outro grande caso é o do Brasil, com o drex. O projeto já passou por uma longa primeira fase de testes e segue com estudos de casos de uso, ainda sem data para lançamento. Além disso, apesar de ter sido anunciado inicialmente como o “real digital”, o presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, reforçou que o drex não é uma CBDC, mas sim um DLT para uso de tokenização e contratos inteligentes.

O futuro das CBDCs

Mais países irão lançar CBDCs a médio prazo.

É provável que preocupações sobre a privacidade só aumentem. Parte dos defensores de CBDCs apontam que as moedas digitais como uma solução de privacidade.

Em junho de 2021, Fabio Panetta, membro do comitê do BCE, argumentou que um euro digital seria mais privado do que stablecoins emitidas de forma privada porque “não temos interesse comercial em armazenar, gerenciar ou monetizar dados de usuários”.

Porém, outros levaram preocupações sobre as consequências de privacidade de CBDCs por apresentarem uma oportunidade para que Estados fiquem de olho por fluxos monetários a nível macro e, problematicamente, a nível individual.

Mu Changchun, diretor do Instituto de Pesquisa de Criptomoedas do Banco do Povo da China, já garantiu que o yuan digital terá “anonimidade limitada”, em que pequenos pagamentos serão ligados aos números de telefone de usuários e maiores pagamentos vão exigir mais dados de KYC.

Nos EUA, legisladores conservadores argumentaram que o yuan digital da China deve ser usado para “expandir iniciativas nacionais de supervisão” ou até mesmo “impor disciplina partidária”.

O deputado Tom Emmer notou que uma CBDC só seria benéfica se fosse “aberta, apermissionada e privada”.

*Traduzido e editado com autorização do Decrypt.