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CVM e a atualização da Resolução 88: o novo capítulo da regulação no mercado de capitais digital

Mudanças sinalizam CVM mais flexível e tecnológica, capaz de lidar com modelos de governança descentralizados e com o uso de smart contracts

Tela de celular mostra logo da Comissão de Valores Mobiliários do Brasil CVM
Shutterstock

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) vive um momento decisivo. Ao abrir consulta pública para revisar a Resolução 88, que regula as ofertas públicas de pequeno porte, o regulador reafirma seu papel central na modernização do mercado brasileiro. 

O movimento vai além de ajustes técnicos: é parte de uma agenda mais ampla de inovação regulatória, que busca acompanhar a evolução tecnológica sem perder de vista a proteção ao investidor.

Esse diálogo entre regulação e tecnologia é algo que o mercado vinha aguardando há anos. Como tenho defendido, o primeiro passo para alcançar uma sinergia real entre inovação e supervisão é o diálogo constante

Hoje, vemos uma CVM aberta e engajada, com diretores presentes em eventos de mercado e dispostos a ouvir o setor sobre os impactos das novas tecnologias. O mesmo vale para o Banco Central, que tem se mostrado igualmente participativo na construção desse novo arcabouço. 

Essa aproximação é o que garante que a regulação evolua na mesma velocidade da inovação.

A Resolução 88 e o salto da tokenização

Entre as normas da CVM, poucas refletem tão bem esse processo quanto a Resolução 88. Originalmente criada para fomentar ofertas públicas simplificadas, ela se tornou, na prática, uma das principais portas de entrada para a tokenização de ativos financeiros.

Os números falam por si: antes da chegada da tokenização, as ofertas sob a 88 somavam cerca de R$ 100 milhões

Depois que a norma passou a acomodar essa nova infraestrutura, o volume saltou para R$ 1,4 bilhão em apenas um ano. É um avanço expressivo, que mostra como a regulação, quando bem calibrada, pode destravar a inovação.

Mas esse sucesso não significa que o trabalho está concluído. A própria CVM reconheceu que o próximo passo é ajustar os limites operacionais e repensar a participação de diferentes perfis de investidores. 

Hoje, o teto de R$ 15 milhões por oferta restringe a escala de muitas operações. Ampliar esse limite, para algo próximo de R$ 100 milhões, permitiria a entrada de investidores institucionais e profissionais, tornando o modelo mais robusto e atraente.

Essa seria uma evolução natural: permitir que operações tokenizadas de maior porte sejam estruturadas dentro da própria 88, sem a necessidade de migrar para regimes mais complexos. 

Com isso, o regulador amplia o alcance da norma, reforça a eficiência e incentiva o desenvolvimento de uma infraestrutura mais digital e menos intermediada.

Uma regulação que aprende com o mercado

O que me chama a atenção é que, diferentemente do passado, a CVM tem mostrado disposição em ajustar suas regras de forma iterativa, observando como o mercado reage antes de implementar mudanças estruturais. 

Esse modelo é especialmente importante em setores em rápida transformação, como o dos criptoativos e da tokenização.

Essa abordagem prática, de testar, medir e ajustar, é o que garante a credibilidade das normas e a confiança dos investidores

Ao reconhecer que a inovação é um processo vivo, a CVM se posiciona não como uma barreira, mas como uma parceira na construção de um mercado mais moderno. 

O Brasil passa a adotar um modelo de supervisão que olha para frente, acompanhando a convergência entre blockchain, finanças descentralizadas e mercado de capitais.

É exatamente isso que temos visto em eventos recentes: uma autarquia mais próxima, com representantes presentes debatendo abertamente os rumos da regulação com o setor privado. Esse tipo de interação não é apenas simbólico, mas fundamental para que o país mantenha o equilíbrio entre inovação e estabilidade.

A atualização da 88 dentro de uma agenda mais ampla

A revisão da 88 não ocorre de forma isolada. Ela integra um processo contínuo de modernização regulatória, que inclui também a Resolução 160, responsável por simplificar o registro de ofertas públicas, e muitas outras que abrem espaço para estratégias mais digitais e com ativos tokenizados.

Essas mudanças sinalizam uma CVM mais flexível e tecnológica, capaz de lidar com modelos de governança descentralizados e com o uso crescente de smart contracts em operações financeiras. 

Ao mesmo tempo, o alinhamento com o Banco Central e a Receita Federal mostra que o Brasil está construindo uma regulação integrada para ativos digitais, baseada em transparência e interoperabilidade.

Esse tipo de avanço coloca o país em uma posição de destaque global. O Brasil tem conseguido combinar inovação com solidez institucional, atraindo atenção de players internacionais que buscam operar em um ambiente que ofereça segurança jurídica e abertura ao novo.

O futuro é colaborativo

A Resolução 88 simboliza mais do que uma norma: representa uma nova mentalidade regulatória. A CVM entendeu que a tecnologia não é um adversário, mas um aliado para construir um mercado de capitais mais acessível, auditável e inclusivo.

Como participante desse ecossistema, posso dizer que estamos começando a viver o que imaginávamos para a tokenização no Brasil há mais de cinco anos. 

O diálogo entre reguladores e mercado amadureceu, a tecnologia ganhou credibilidade e a infraestrutura digital já mostra resultados concretos.

O desafio agora é ampliar o escopo, trazer investidores institucionais, reduzir a burocracia e seguir aprimorando o equilíbrio entre proteção e eficiência. 

Se mantivermos essa trajetória de colaboração entre inovação e regulação, o Brasil poderá se consolidar como referência global em mercado de capitais digital.

No fim das contas, o futuro da regulação é o mesmo da inovação: feito em conjunto, ajustado na prática e construído sobre confiança.

Sobre o autor

Daniel Coquieri é CEO da empresa de tokenização de ativos Liqi Digital Assets. Empreendedor do ramo da tecnologia, foi fundador da BitcoinTrade, uma das primeiras corretoras de criptomoedas do Brasil.

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