Não é comum que um devedor vá resgatar alguém para quem deve dinheiro, principalmente quando o assunto envolve centenas de milhões de dólares.
No entanto, esse é o caso da Alameda Research, empresa fundada pelo bilionário cripto Sam Bankman-Fried que, em junho, estendeu uma linha de crédito de US$ 500 milhões à credora cripto Voyager Digital. A Alameda deve à empresa US$ 377 milhões, de acordo com o documento de recuperação judicial do tipo “Chapter 11” da Voyager.
Uma recuperação judicial do tipo “Chapter 11” propõe um plano de recuperação para manter sua empresa operando e pagar seus credores ao longo do tempo.
É uma revelação inesperada que veio à tona em meio a uma recuperação judicial que parecia ser uma conclusão inevitável desde que o Voyager informou que o fundo de hedge Three Arrows Capital lhe deve mais de US$ 600 milhões.
Uma tabela na página 13 do pedido judicial, enviado a um tribunal do distrito de Nova York na quarta-feira (6), mostra que a Alameda Research deve US$ 377 milhões à Voyager, a uma taxa de juros que varia entre 1% e 5%.
O saldo pendente inclui um empréstimo sem garantia de US$ 75 milhões, de acordo com uma lista de créditos sem garantia (ou “quirografários”, com a promessa de que serão pagos no vencimento) da Voyager na página 119 do documento.
A Alameda Research não respondeu imediatamente ao pedido por comentários do Decrypt.
A dívida da Alameda a torna na segunda maior devedora da Voyager, atrás apenas do insolvente fundo Three Arrows Capital (ou 3AC).
Quando a extensão do problema da 3AC ficou evidente, devido aos US$ 200 milhões perdidos no colapso do Terra em maio, seus credores começaram a perceber que enormes empréstimos ao 3AC em suas contas estavam prestes a entrar em moratória.
Quando o 3AC não conseguia mais realizar pagamentos, a Voyager emitiu um alerta de inadimplência na segunda-feira passada (27). Na quarta-feira (29), um tribunal das Ilhas Virgens Britânicas ordenou a liquidação do 3AC. Assim, o fundo deve encerrar todas as suas operações e permitir que o tribunal supervisione a venda de seus ativos para compensar o que deve a seus credores, incluindo a Voyager Digital.
Participação societária
É importante destacar que Sam Bankman-Fried, fundador e CEO da corretora de criptomoedas FTX, possui um interesse pessoal em socorrer a Voyager. Em certo momento, Alameda e sua unidade de capital de risco, Alameda Ventures, eram as maiores shareholders da Voyager, com 11,6% de todas as participações em circulação, de acordo com um comunicado de imprensa divulgado no dia 17 de junho.
Na época, a ação da Voyager (VYGVF) estava sendo negociada um pouco acima de US$ 1.
Uma semana depois, no dia 23 de junho, Alameda anunciou, em um comunicado, que havia entregue, ou devolvido sem expectativa de obter dinheiro, 4,5 milhões dessas ações. Essas ações eram equivalentes a US$ 2,6 milhões na época e VYGVF estava sendo negociada a US$ 0,56 por ação.
A entrega de ações da Alameda fez sua participação na empresa cair para 9,49% — abaixo do limite de 10% que a teria tornado em uma “parte privilegiada”, segundo a Comissão de Valores Mobiliários e de Câmbio dos EUA (ou SEC).
Essa é a mesma regra da SEC que exigiu que o CEO da Tesla, Elon Musk, divulgasse sua participação no Twitter em abril antes que o bilionário fizesse sua oferta de aquisição.
Na quarta-feira, após a Bolsa de Valores de Toronto ter suspendido a negociação da ação da Voyager Digital, havia terminado o dia precificada em US$ 0,27.
*Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.