O Serviço de Fiscalização da Receita Federal do Brasil está pedindo esclarecimentos minuciosos sobre o histórico de transações de Bitcoin de uma das maiores figuras do mercado nacional de criptomoedas. Eu tive acesso ao documento completo, mas por uma questão de segurança e sigilo, não irei revelar o nome de quem foi “intimado”.
No Termo de Início de Fiscalização, o nome técnico do documento a que tive acesso, o auditor do fisco exige que a pessoa citada envie “comprovantes de todas as transações com moedas virtuais (bitcoins), no período de 01/01/2015 a 31/12/2017, com as respectivas notas de corretagem ou quaisquer outros documentos comprovando a conversão em outras moedas, em papel”.
Além desses comprovantes, o autor do pedido também pede para o contribuinte “demonstrar a origem de saldo em bitcoins que possuía em 31/12/2014, ou seja, apresentar comprovantes de todas as transações efetuadas com moedas virtuais que resultaram no saldo existente em 31/12/2014”.
Como podemos ver na imagem abaixo, que é um trecho do documento, a Receita Federal fez outras solicitações:
O motivo principal dessa fiscalização é porque a pessoa sob fiscalização não incluiu qualquer menção sobre Bitcoin em suas declarações de imposto de renda. Presumo que a pessoa em questão deva ter os seus motivos pessoais e legais para ter feito isso e não vou entrar no mérito se ela está certa ou errada.
Para mim, quem mora no Brasil deve pagar os seus impostos corretamente para o melhor funcionamento da sociedade.
O que a Receita Federal quer
O que mais me chama atenção nesse caso é a atitude da Receita Federal de, finalmente, depois de tantos anos, ter ido atrás de alguém que trabalha com Bitcoin para, aparentemente, cobrar a conta do imposto de renda.
A pergunta que fica é se faz sentido cobrar informações detalhadas de períodos nos quais a própria Receita não havia estipulado a declaração das operações realizadas com criptoativos como regra obrigatória.
Foi somente em 2017, principalmente por causa da astronômica valorização do preço do Bitcoin, que a Receita passou a pedir com mais ênfase que as pessoas declarem as transações. Contudo, ela tampouco deixou explícito se apenas os indivíduos que obtiveram ganho de capital é que deveriam reportar tais operações ou também aqueles que não tiveram algum ganho atrelado.
De qualquer forma, será que esse caso específico significa o início de uma força-tarefa da Receita para caçar os “bitcoiners” que sonegam impostos? Talvez tenhamos razões suficientes para acreditar que este seja o caso.
A festa acabou?
Em novembro do ano passado, escrevi em meu blog que a Receita Federal estava querendo “acabar com a festa” no mercado de Bitcoin. Naquele artigo, analisei a proposta feita pelo órgão tributário brasileiro por meio de uma instrução normativa que pretendia exigir que as corretoras de criptoativos do país fornecessem informações detalhadas sobre todas as operações realizadas nas plataformas de compra e venda.
Até onde tenho conhecimento, aquele texto sugerido por dois auditores da Receita ainda não ganhou uma versão final, tampouco as corretoras de criptoativos nacionais começaram a repassar os detalhes de todos os negócios. Contudo, acredito que em breve teremos novidades em relação a essas regras.
Também vale lembrar que desde a chegada do novo governo federal de Jair Bolsonaro, o ministério da Justiça, sob comando do juiz Sérgio Moro, passou a incorporar o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), órgão ligado à prevenção e combate à lavagem de dinheiro.
Anteriormente, o Coaf era parte integrante do Ministério Fazenda, e era considerado uma espécie de irmão da Receita Federal, que respondia para a mesma pasta ministerial. Ao trazer o órgão para o ministério da Justiça, Moro nomeou Roberto Leonel, que era da área de inteligência da Receita Federal. Existem pessoas que acreditam que o Coaf passará a vigiar mais de perto as suspeitas de lavagem de dinheiro e evasão de divisas realizadas com criptoativos.
Apenas o tempo dirá se os órgãos de fiscalização da atividade financeira no Brasil irão apertar o cerco para aqueles que atuam no mercado de Bitcoin e criptoativos, mas tudo indica que os tempos de “velho oeste” do Bitcoin no Brasil estão com os dias contados.
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* Allex Ferreira é fotógrafo e negocia Bitcoin no mercado P2P desde 2011. Na China, esteve à frente de grandes operações de mineração de Bitcoin. Também escreve no blog Barão do Bitcoin, apelido pelo qual é conhecido na comunidade brasileira.