Qual será o impacto do acordo da BlockFi com a SEC no mercado de empréstimos de criptomoedas?

A empresa paga altos retornos para clientes que armazenam bitcoin ou outras criptomoedas em suas contas
Logotipo da BlockFi na tela de computador

Shutterstock

A credora de criptomoedas BlockFi deve pagar US$ 100 milhões a reguladores federais e estatais de valores mobiliários para encerrar acusações de que falhou em registrar de forma adequada suas “Blockfi Interest Accounts” (ou BIAs, na sigla em inglês), segundo um comunicado de imprensa publicado pela Comissão de Valores Mobiliários e de Câmbio dos EUA (ou SEC) na segunda-feira (14).

A notícia vazou na noite da última sexta-feira (11) e foi confirmada com mais detalhes pela agência na segunda-feira.

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Advogados no setor cripto afirmam que, embora os termos do acordo possam fornecer um manual regulatório para empresas cripto centralizadas, podem sinalizar um perigo para organizações autônomas descentralizadas (ou DAOs) e resultar em escolhas piores para clientes.

A BlockFi ganha dinheiro, em parte, ao pagar juros de até 10% por depósitos cripto como bitcoins (BTC) e stablecoins, e em seguida, emprestar esses ativos a juros maiores. De acordo com a SEC, BIAs são valores mobiliários, mas não foram registradas como tais.

A agência também alega que a BlockFi “exagerou o grau em que garantiu proteção de inadimplência por mutuários institucionais por meio de garantia”. Basicamente, e empresa disse que a maioria de seus empréstimos tinha com garantias excessivas quando não as tinha.

A empresa deve pagar uma penalidade de US$ 50 milhões à SEC, além de outros US$ 50 milhões em multas para 32 estados, e ainda parar de registrar novas contas e atender aos requisitos da Lei de Empresas de Investimentos em até 60 dias. A BlockFi não confirmou nem negou as acusações da agência.

Ao que parece, a BlockFi tenta ver a situação de forma positiva, afirmando que irá se registrar na SEC e apresentar uma nova oferta que ajudará a esclarecer questões regulatórias para produtos similares: “Pretendemos que BlockFi Yield seja um novo valor mobiliário de geração de juros com criptomoedas e registrado na SEC, permitindo que clientes ganhem juros sobre seus criptoativos”.

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Muitos advogados no setor cripto (bem como leitores do Decrypt) já previam isso.

A BlockFi e sua adversária Celsius haviam recebido ordens de cessar e desistir e ordens de justificação de diversos estados americanos em 2021, antes de a SEC se envolver para investigar a BlockFi em novembro.

Em setembro, a agência também havia afugentado a corretora cripto Coinbase de oferecer um produto similar.

Marc Boiron, diretor jurídico da corretora descentralizada desenvolvida no Ethereum dYdX, afirma que o acordo parece ser um “golpe publicitário da SEC”.

Segundo ele, a agência demostrará ser dura com o mercado cripto enquanto também se mostra “disponível para o registro de produtos cripto para ofertas públicas”.

“BlockFi, um grupo centralizado de entidades, oferece um produto muito simples que sempre deveria ser fácil de registrar, independentemente de ter que se registrar”, afirmou Boiron.

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Mas para a representante da SEC, Hester Peirce, a BlockFi ainda terá meses difíceis pela frente.

“A BlockFi não poderá aceitar novos investidores de varejo cripto até que a empresa tenha registrado um novo produto de empréstimo cripto com o ‘Form S-1’”, afirmou ela em uma declaração no site da SEC.

“Form S-1” é um documento de registro inicial que deve ser enviado por uma empresa americana à SEC antes de seu produto financeiro estar disponível para o mercado local.

“Obter um S-1 ao ponto em que a equipe irá declarar [o produto] como efetivo é um processo que demora meses”, afirmou ela, antes de acrescentar: “Quando cripto está em questão, é provável que o prazo seja mais longo do que o de documentos mais tradicionais”.

Além disso, ela não acredita que a BlockFi irá superar facilmente outro obstáculo após o S-1: em uma situação sem saída, não será capaz de se registrar como uma empresa de investimentos – categoria que se aplica a empresas que oferecem fundos mútuos, fundos fiduciários específicos, fundos de investimento fechado e até alguns fundos de hedge –, então terá de solicitar por uma exclusão de registro.

Dada a “falta de experiência” da SEC com tais casos e seu ceticismo de empresas cripto, Peirce acredita que o prazo de 60 dias é “extremamente ambicioso”, mesmo se obtiver uma extensão de 30 dias.

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Segundo Collins Belton, sócio-gerente da empresa Brookwood P.C., a provisão da empresa de investimentos colocará outros produtos em evidência, e não apenas a Celsius e credoras cripto.

Ele afirma que futuras medidas coercitivas “não devem ser surpreendentes mas, infelizmente, haverá muitas, principalmente para participantes de ‘DAOs’ que não são realmente ‘D’ [descentralizadas]”.

Muitos grupos on-line são formados como DAOs para atrair fundos e realizar investimentos (conforme tokens específicos de DAOs atuam parecidos com ações para direitos de votação e participações em uma empresa).

Alguns desses projetos são (mesmo se não forem centralizados, por assim dizer) bastante influenciados por alguns holders de tokens.

Belton destaca, de uma forma um tanto quanto ameaçadora, que “pools de ativos gerenciados de forma central são uma das poucas coisas que a SEC/CFTC ‘entende’ quando o assunto é cripto”.

Mas de acordo com envolvidos na indústria cripto que são a favor de tais produtos, o maior impacto será em clientes que não estão satisfeitos com contas-poupança de fiduciárias que geram uma fração de um por cento.

Katherine Wu, do Coinbase Ventures, afirma que a justificativa de proteção a clientes da SEC não faz sentido dadas as alternativas: “Se isso significa que clientes americanos que querem rendimentos agora precisam levar seus ativos para esses protocolos DeFi ‘descentralizados’ [com] designs questionáveis de tokens ([com] pesquisa mínima), é algo negativo [para os cidadãos]”.

*Traduzido e editado por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.