Membro da MSK Invest revela como a funcionava empresa acusada de pirâmide financeira

Homem acusado pelos donos da MSK de ter roubado R$ 400 milhões em criptomoedas afirma que empresa mantinha esquema para maquiar contabilidade
Ambiente interno de um dos escritórios da MSK Invest

Ambiente interno de um dos escritórios da MSK Invest (Foto: Reprodução)

“Foi uma verdadeira pirâmide. Talvez a mais estruturada do país”. A afirmação sobre a MSK Invest é de Saulo Gonçalves Roque, ex-funcionário da empresa que está no centro de uma intensa disputa jurídica no caso que deixou um rombo multimilionário que afetou cerca de 3,5 mil pessoas. 

Em conversa com Portal do Bitcoin, Roque deu sua versão sobre como era a operação da empresa. Ele é um personagem central de toda a história: os líderes, Glaidson Tadeu Rosa, Carlos Eduardo de Lucas e Fernando Fernandes passaram a afirmar no começo de 2022 que o ex-funcionário era o diretor de operações e que foi o responsável por roubar as criptomoedas da companhia e impedir que os pagamentos fossem feitos aos clientes. 

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A MSK Invest prometia ganhos fixos de 5% ao mês, que seriam obtidos com investimento em criptomoedas. Em dezembro de 2021, parou de pagar os clientes. Meses depois, chegou a fazer um acordo com o Procon, mas os usuários nunca mais viram um centavo

Em janeiro deste ano, os líderes da empresa foram indiciados pela Polícia Civil de São Paulo por formação de organização criminosa, pirâmide financeira, lavagem de dinheiro, estelionato, falsidade ideológica, publicidade falsa ou enganosa. 

O relatório diz o seguinte sobre a acusação dos sócios da MSK contra Roque: “Tentaram envolver um colaborador da empresa como o responsável pelo desvio de carteiras de criptomoedas, o Senhor Saulo Gonçalves, situação esta que restou afastada pelas provas colacionadas aos autos, especialmente o rastreamento das carteiras de criptomoedas e a farta prova testemunha”. 

O advogado Pedro Torres, que representa vítimas da empresa e que se tornou assistente de acusação da promotoria no caso, afirma que seria fácil a MSK mostrar que o ex-funcionário de fato tem a posse das carteiras, o que nunca ocorreu. 

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“Até hoje, nunca teve nenhuma prova [de que Saulo teria controle das carteiras]. O que seria bastante fácil, né? Porque você não pode provar que o seu trader tinha controle das carteiras que a empresa usava para operar? Seria muito fácil mostrar a carteira na qual ele trabalhava, qual era o volume das operações, e por aí vai. Isso nunca aconteceu”, disse Torres ao Portal do Bitcoin

Números inflados para contabilidade, diz Saulo

Saulo afirma que de março de 2020 em diante, a MSK criou um esquema para maquiar a contabilidade e que nesse momento ele tem certeza de que passou a ser uma pirâmide integralmente.

“O interesse deles nessas operações de OTC [termo em inglês para over the counter] era dar com o corpo a contabilidade como se realmente existisse dinheiro. Por quê? Porque a arrecadação da MSK estava fraca. Então ela teve que pegar dinheiro de fora para criar uma falsa operação, para mostrar para um cliente que queria investir 10 milhões, 20 milhões… Tem cliente lá de 30 milhões, tá? Mostrar para ele que tinha operação. O que mostrava? Contabilidade. Só que eles nunca mostraram pra ninguém uma carteira com saldo. Nunca existiu”.

Segundo o antigo funcionário, ele conheceu os líderes da MSK em 2018 e atuou como consultor. No final de 2021, diz que viu que a operação iria colapsar e que os donos já estavam armando o cenário para colocar a culpa nele.

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Porém, Glaidson e os sócios da MSK têm sua versão para os ocorridos e um polêmico áudio como trunfo.

O diálogo entre Glaidson e Saulo

A única tese de defesa da MSK Invest é de que Saulo roubou todas as criptomoedas e fez a operação ficar inviável. A Polícia Civil descartou essa tese no indiciamento. A MSK aposta em um áudio de uma conversa entre Glaidson e Saulo, feita em janeiro de 2022. O Portal do Bitcoin ouviu o material e, na conversa, ocorre o seguinte diálogo:

Glaidson – As moedas estão com você, a senha está com você, é você que tem acesso às moedas. Eu não sei, eu não consigo fazer algo, eu não consigo, nem eu nem o Fernando. Me dá o acesso, cara. Se eu tivesse o acesso, eu fazia, cara. Maninho passa para Fernando o acesso às moedas.

Saulo – Vou passar.

Glaidson – Mas você vai passar quando?

Saulo– Vou passar amanhã.

Glaidson – Passa agora para ele aqui, passa agora para ele, maninho. Passa agora, eu dou minha palavra, se ele arrancar uma moeda a mais do que é devido, maninho, uma a mais do que é devido, uma a mais, eu denuncio ele de roubo, passa para ele o acesso agora.

Saulo – Vou passar o acesso para ele amanhã.

Glaidson – Você quer ir lá e voltar agora, a gente espera você aqui, maninho. Mas eu preciso, cara. Eu preciso. Faz o seguinte, vamos na sua casa agora, você pega, maninho. Maninho, é sério cara.

Saulo – Desculpa, mas eu não vou fazer isso não. Desculpa, é sério. Eu sei a gravidade do problema.

Glaidson – Não, você não sabe.

Saulo – Sei sim.

Questionado pela reportagem sobre o áudio, Saulo afirma que estava mentindo conscientemente sobre ter a posse as criptomoedas. Ele afirma que sentia coagido.

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“Já tinha sido ameaçado e pessoas me perseguindo. Foi uma maneira de eu mentir para a minha segurança. Depois, prontamente me apresentei na delegacia para falar a verdade”, disse Saulo.

A versão da MSK

O Portal do Bitcoin questionou o líder da MSK Glaidson Tadeu Rosa sobre como foi possível um funcionário ter roubado a totalidade do patrimônio da empresa sem nenhum mecanismo que pudesse impedir ou gerar alerta.

Glaidson afirma que Saulo teria se valido da confiança criada entre as partes: “Nós não tínhamos o porque desconfiar depois de um trabalho de anos, um trabalho que era feito diariamente”. 

Depois, quando questionado sobre detalhes de como teria ocorrido esse roubo, a resposta veio de Fernando Fernandes, funcionário da MSK que participou da entrevista: “Como foi feito, como ele conseguiu, isso está em segredo de Justiça, Expor isso pode atrapalhar a tentativa de recuperar os bitcoins dos clientes que já foram localizados”. 

Glaidson não quis dar detalhes, mas resumiu sua tese: “No final de 2021 foi quando decidimos sair do mercado de critpomoedas. Por conta de questões burocráticas, dificuldades bancárias, dificuldade de agilidade em plataforma. Decidimos sair do mercado cripto e definimos em devolver em dez meses os valores dos clientes. Isso estava em planejamento e foi quando houve a apropriação indébita.”

Na investigação geral que resultou no indiciamento de Glaidson e dos outros sócios, a Polícia Civil de São Paulo descartou a tese de apropriação indébita. Os líderes da MSK fizeram um B.O em separado, que afirmam que ainda está em aberto.

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Já Saulo afirma que o inquérito de apropriação indébita foi aberto no 96º DP de São Paulo e que houve uma manifestação do Ministério Público para fosse juntado ao inquérito principal da MSK, que passou ser competência do Departamento de Polícia de Proteção à Cidadania (DPPC). Com o indiciamento do donos da MSK e o inquérito relatado, esse processo teria se encerrado.

Essa versão, de que o processo por apropriação indébita foi arquivado, foi confirmada por Pedro Torres, o advogado das vítimas que se tornou assistente de acusação.

CPI das Pirâmides Financeiras

Na quarta-feira (16), Glaidson Tadeu Rosa e Carlos Eduardo de Lucas prestaram depoimento na CPI das Pirâmides Financeiras. Os investigados apostaram todas as suas fichas em acusar todos os problemas da empresa como decorrentes de um roubo feito por Saulo Roque.

Os deputados membros da comissão não citaram o indiciamento da Polícia Civil de São Paulo e foram, no geral, muito mais brandos com os líderes da MSk do que com representantes da GAS Consultoria e Rental Coins.

Agora, os deputados irão convocar Saulo Roque para que ele dê sua versão do ocorrido na Câmara dos Deputados

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