Em junho de 2015, a União Federal entrou com um processo contra o Google e o Daniel Fraga, um dos pioneiros do bitcoin no Brasil. Na ação, o Estado pedia que a gigante de tecnologia removesse do Youtube três vídeos em que Fraga, desaparecido desde 2017, faz duras críticas à Receita Federal.
No ano passado, a 14ª Vara Cível de São Paulo considerou os vídeos “ofensivos e ilícitos”, deu ganho de causa à União e a empresa americana teve que retirá-los da plataforma. A sentença, no entanto, foi genérica e não citou as URLs do audiovisuais, mas apenas os títulos dos vídeos de Fraga: ‘Receita Federal ensina como roubar (ou aprenda a roubar com a receita federal)’, ‘Sonegação: crime sem vítima’ e ‘Contrabando: crime sem vítima’.
Na época, o Google entendeu que a decisão judicial poderia gerar um tipo de “controle eterno de conteúdo produzido e publicado por usuários na internet veiculados aos termos indicados”, além de censura. A empresa decidiu então entrar com uma apelação judicial (tipo de recurso), pedindo para a União especificar os endereços exatos dos vídeos que deveriam ser removidos.
“A tese ora defendida não constitui formalismo ou preciosismo: o que se busca é garantir a efetividade e a segurança à obrigação direcionada a Google, por meio da remoção de endereços eletrônicos (URLs) apontadas nos autos. Caso contrário, a apelante permanecerá submetida a um comando, com todo respeito, deveras abrangente”, disse a empresa americana.
Justiça pede quais URLs
No domingo (20), o desembargador federal Wilson Zauhy, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, acatou o pedido da gigante de buscas e determinou que a ordem judicial se restrinja apenas às URLs dos três vídeos publicados no canal de Fraga.
“Desse modo, apenas para maior clareza do provimento jurisdicional, acolho o pedido da apelante para consignar expressamente que os vídeos cuja veiculação deve ser suspensa são somente aqueles de endereços de URL mencionados”, disse o magistrado.
A decisão livra o Google de ter que apagar e censurar as cópias dos vídeos de Fraga compartilhados por outros canais no YouTube, como o ‘Instituto Libertário’, que publicou dois deles (um aqui e outro aqui) e o ‘Mr. Libertário’, que compartilhou o terceiro.
Para convencer a Justiça sobre a importância de não estender a decisão para outros canais, o Google citou que, conforme estipula o Marco Civil da Internet, é preciso especificar o conteúdo ilícito a ser removido, com intuito de “assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura”.
O Portal do Bitcoin entrou em contato com o Google. Em nota, a empresa disse que não comenta casos específicos. Afirmou, no entanto, que o “YouTube apoia, de modo consistente, o importante trabalho das autoridades e cumpre ordens judiciais de acordo com o Marco Civil da Internet”.
O que dizem os vídeos
No vídeo ‘Receita Federal ensina como Roubar’ (ou Aprenda a roubar coma Receita Federal)’, Fraga diz que funcionários da Receita Federal fazem parte de uma máfia e são “ladrões engravatados”, além de “idiotas úteis”.
Em “Sonegação: crime sem vítima”, o entusiasta do bitcoin fala que os cofres públicos são ladrões e que juristas e criminalistas não são confiáveis. Por fim, em “Contrabando: crime sem vítima” Fraga defende que o contrabando deve ser estimulado, pois o Estado rouba mercado.
Quem é Daniel Fraga
Fraga está desaparecido há cerca de três anos. Ele ganhou fama em 2012 como um youtuber anarcocapitalista sem papas na língua que comprou bitcoin quando valia apenas R$ 12 a unidade.
Parte da sua fama ainda se deve a processos movidos por autoridades que foram alvo de suas falas ácidas, como prefeitos, deputadas, auditores da Receita e até juízes.
Nas ações, a Justiça não consegue citar Fraga, que sumiu sem deixar vestígios. Apesar do desaparecimento misterioso, em novembro deste ano o entusiasta movimentou a conta dele na LocalBitcoins, plataforma que permite trocas P2P de bitcoins.
Em maio, um youtuber americano chamado Arthur James McDaniel produziu um mini-documentário sobre o Fraga. “Enquanto muitos dos pioneiros do bitcoin enriquecerem e ficam esbanjando seu dinheiro, um deles está fugindo do governo”, falou, em referência ao brasileiro.